É difícil aceitar qualquer justificativa para quem cobra o triplo do valor que emprestou depois de um ano. Mas os bancos brasileiros não deixam de tentar.
Quebrar um banco no Brasil é obra para poucos. É preciso um conjunto de trapalhadas para sequer fazer uma instituição financeira dar prejuízo por aqui. Para falir um então, realmente é coisa para alguém especial. E os números mostram como o setor bancário no País dificilmente vai sentir efeitos de qualquer tipo de crise.
Vamos tomar o exemplo mais extremo, mas que dá uma boa noção da maneira como o crédito é gerido de maneira muito particular no Brasil. O Cheque Especial. A linha é uma das mais oferecidas para as pessoas físicas pelos gerentes de bancos, e não é a toa. Segundo dados do Banco Central, são R$ 21 bilhões em estoque dessa modalidade. E isso quer dizer que no final de 2014, R$ 21 bilhões em limites de crédito rotativo eram utilizados pelas pessoas físicas.
A taxa de juros dessa linha, em dezembro, chegou a 200,6%. Sim, quem utiliza o cheque especial atualmente, vai pagar, depois de um ano, em média, o triplo do limite utilizado. Isso sem contar as tarifas e o Imposto sobre Operações Financeiras (IOF). E é importante ressaltar que essa é a média. Ou seja, boa parte das pessoas paga bem mais que isso.
Uma das justificativas mais usadas pelos bancos para essa taxa exorbitante é a inadimplência, ou ao menos, o maior risco de atrasos. Mas os números do BC mostram que esse dado não serve mais como argumento. Em dezembro de 2012, a média de atrasos de 15 a 90 dias, no Cheque Especial, era de 4,5% do total concedido. No ano passado, a inadimplência fechou em 4,6%. Levando-se em conta o cenário econômico dos últimos anos, é até surpreendente que esse número não seja maior.
E quando vamos para o número geral, que mostra a inadimplência em qualquer período, o número também não mostra uma variação expressiva. Saiu de 9,1%, ao final de 2012, para 9,5%, no fechamento de 2014. Apesar de uma taxa considerada alta, é difícil conseguir acreditar que ela justifique juros a 200%. Até porque, em dezembro de 2012, os juros do Cheque Especial estavam em 138%. Um avanço superior a 60 pontos percentuais, em dois anos.
E ao mesmo tempo, entra-se no dilema de causa e efeito. É a inadimplência que causa os juros altos, ou os juros altos que causam inadimplência? Se depender dos bancos, a primeira opção sempre será a resposta. Acontece que quando se cobra uma taxa tão alta, que compensa com sobras todos os custos de captação e operacionais, uma pessoa que pague esses juros compensa eventuais e pontuais perdas que um banco tenha com atrasos. E de longe.
Esse é um dos casos de abuso no sistema financeiro, e que só pode ser resolvido pelo Banco Central, ou pelo governo, por meio dos bancos públicos. Não há saída "via mercado". É um desrespeito com o consumidor, com aval de todas as autoridades. A regulação bancária no Brasil é muito eficiente na proteção às instituições financeiras. Ela precisa ter essa mesma eficiência para proteger o tomador de crédito. E estamos bem longe disso.
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