A juíza federal Ivani Silva
da Luz, da 6ª Vara de Brasília, proibiu nesta sexta-feira (29) o governo do
presidente Jair Bolsonaro de realizar eventos em comemoração ao aniversário de
55 anos do golpe militar em 31 de março, data que marcou o início da ditadura
no Brasil.
A decisão atende a um pedido
da Defensoria Pública da União, que no início da semana entrou com uma ação
civil pública a fim de impedir as comemorações. O órgão alegou violação à
memória coletiva e à verdade, bem como uso irregular de recursos públicos.
"Defiro o pedido de
tutela de urgência para determinar à União que se abstenha da ordem do dia
alusiva ao 31 de março de 1964, prevista pelo ministro da Defesa e comandantes
do Exército, Marinha e Aeronáutica", afirmou a juíza, segundo o jornal
Folha de S. Paulo. Ela também determinou que o Ministério da Defesa seja
intimado da ordem.
Silva da Luz já havia
intimado Bolsonaro e a União a se manifestarem sobre o caso, mas no âmbito de
outra ação movida na terça-feira na tentativa de barrar as comemorações
determinadas pelo governo federal.
Em seu pedido, a Defensoria
Pública afirmou que são de conhecimento público os "horrores" vividos
durante o regime ditatorial, mencionando relatórios da Comissão da Verdade e
dados sobre mortos, torturados e desaparecidos no período, que se estendeu de
1964 a 1985.
O órgão argumentou ainda que
comemorar um regime que perseguiu, torturou e assassinou pessoas violaria a
moralidade administrativa, bem como a memória coletiva, estimulando "que
novos golpes e rupturas democráticas ocorram" e atentando contra a
democracia e o Estado de Direito.
Durante a semana, vítimas e
parentes de vítimas da ditadura se somaram ao coro e pediram ao Supremo
Tribunal Federal (STF) que concedesse uma liminar impedindo as comemorações
ordenadas pelo presidente.
Na última segunda-feira, o
porta-voz da Presidência, general Otávio Rêgo Barros, anunciou que Bolsonaro
havia determinado ao Ministério da Defesa que fossem feitas "comemorações
devidas" no próximo domingo, 31 de março, para marcar o início da ditadura
militar.
O general ainda afirmou que
Bolsonaro não considera que houve um golpe militar em 1964. O próprio
presidente disse ao longo da semana que, em sua concepção, não houve ditadura
militar no Brasil e defendeu que todo regime, como todo casamento, tem alguns
"probleminhas".
Na quinta-feira, ele suavizou
o tom. Segundo Bolsonaro, a ordem não foi para que as Forças Armadas comemorem
o golpe, mas que "rememorem". "Foi rememorar, rever, ver o que
está errado, o que está certo. E usar isso para o bem do Brasil no futuro",
afirmou o presidente, que é capitão reformado.
A proibição da juíza deve
impedir qualquer evento marcado para o domingo, embora cerimônias já tenham
sido realizadas nos últimos dias. Na quinta-feira, houve uma solenidade no
Comando Militar do Sudeste com a presença de seis deputados estaduais do PSL,
partido de Bolsonaro.
Na manhã desta sexta, o
Exército realizou uma cerimônia no pátio do Comando Militar do Planalto, em
Brasília, que começou às 8h e durou apenas meia hora. O evento já constava na
agenda do comandante do Exército, general Edson Leal Pujol, desde o início da
semana, como "Solenidade comemorativa ao dia 31 de março de 1964".
O 31 de março foi retirado do
calendário oficial do Exército em 2011 por determinação da então presidente,
Dilma Rousseff, que foi torturada no regime ditatorial. Agora, com Bolsonaro na
Presidência e diversos militares ocupando cargos ministeriais, o retorno da
data à agenda estaria sendo avaliado pelas Forças Armadas.
Bolsonaro sempre afirmou que
o período de 21 anos não foi uma ditadura. Durante a votação do impeachment de
Dilma, em 2016, ele chegou a homenagear o coronel Carlos Alberto Brilhante
Ustra, reconhecido pela Justiça de São Paulo como torturador durante o regime
militar.
A ditadura militar, que se
estendeu de 1964 a 1985, teve início com a derrubada do governo do então
presidente democraticamente eleito, João Goulart, e foi marcada por censura à
imprensa, fim das eleições diretas para presidente, fechamento do Congresso
Nacional, tortura de dissidentes e cassação de direitos.
Segundo dados da Comissão
Nacional da Verdade, mais de 8 mil indígenas e ao menos 434 suspeitos de serem
dissidentes políticos foram mortos ou desapareceram forçadamente durante o
regime. Estima-se ainda que dezenas de milhares de pessoas foram
arbitrariamente detidas e torturadas./TERRA
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