Além do câncer de mama e da
falta de remédio para combater as fortes dores provocadas pela doença, a
itanheense Ana Paula Alves da Fonseca, de 37 anos, tem que conviver com
comentários indesejáveis de pessoas ligadas ao primeiro e segundo escalões da
administração da prefeita Zulma Pinheiro.
O Água Preta News teve acesso
a um áudio no qual a secretária da Saúde, Renilda Chapeu, explica – segundo o
seu entendimento – a situação da doença de Ana Paula. No diálogo, a secretária
ainda insinua que Ana Paula é usuária de droga e afirma, categoricamente, que a
paciente é viciada em morfina.
O site omitiu,
propositalmente, os nomes do interlocutor da secretária e do médico, citados no
áudio.
“O caso dessa mulher é o
seguinte: eu já até levei Zulma [a prefeita] lá na casa dela, ela faz
tratamento CA [câncer] na Unacon [Unidade de Alta Complexidade em Oncologia, em
Teixeira de Freitas]. Em todas as consultas dela o carro vai à porta, leva na
Unacon e traz de volta. Todos os exames pedidos são ofertados pela secretaria
da Saúde, medicação [também], não falta nada pra essa mulher. Ela recebe
cesta-básica, já visitei e até levei Zulma, eu mesmo levo o remédio dela”,
disse a secretária da Saúde, inicialmente.
De acordo com a fala da
secretária, a paciente faz uso de morfina de forma indevida.
“O remédio não é para tomar
da forma que ela toma; o remédio que é para durar um mês ela toma numa semana,
dois dias, entendeu? A medicação é a morfina – que é o remédio que é tomado em
estado terminal, em caso de uma dor muito grande -, mas o médico dá sim um dia
para melhorar aquela dor, uma pessoa saudável não pode tomar essa medicação
constantemente. Segundo os médicos, esse remédio pra tomar a quantidade que ela
toma só em estado terminal, que a pessoa já vai morrer mesmo, pra não morrer
com dor, entendeu? Mas ela está saudável, apesar da doença dela, ela está
fazendo tratamento, ela não pode estar tomando esse tanto de remédio”,
explicou.
A secretária disse que a
paciente usa a doença para “fazer show” e a oposição política à prefeita vem
aproveitando da situação e jogando nas redes sociais.
“Então, está difícil até de
conseguir a receita pra ela e toda receita que eu consigo eu compro [remédio].
Agora, quando ela não consegue a receita e que ela fica querendo o remédio ela
faz esse show aí. Aí Branca [que faz oposição à prefeita] aproveita, filma ela
e põe nas redes sociais e aí ela fica falando. Até o pessoal dos Estados Unidos
está comovido para mandar dinheiro pra ela comprar morfina, entendeu? É isso
que está acontecendo”, afirmou.
Renilda Chapéu, com uma certa
cautela, acusou Ana Paula de ser usuária de droga e dependente de morfina.
“E não é só morfina que ela
usa, é… sabe? Também não posso estar expondo o nome dessa mulher, falando dela
coisas que eu não provo, né? E ela é paciente, nós temos que cuidar. Agora,
quantas receitas chegar aqui eu compro, nunca deixei de comprar. Agora, sem a
receita é impossível, os médicos já estão negando de dar a receita, né? E eu
estou agora pra conseguir uma receita, eu estou com quatro caixas pra levar,
mas sabendo o que ela vai fazer com esse remédio; infelizmente eu não posso”,
lamentou.
No diálogo, a secretária
mostrou-se preocupada com a repercussão negativa que, segundo ela, o caso vem
trazendo para a administração da prefeita Zulma Pinheiro e afirmou que a
paciente recebe toda assistência por parte da secretaria da Saúde.
“Ela está usando as redes
sociais, mas eu tenho que está explicando às pessoas e as pessoas podem achar
que realmente nós não estamos fazendo nada e nós estamos. Ela recebe medicação,
ela recebe transporte para ir para a Unacon, ela recebe exame, tudo que é
pedido pra ela, cesta-básica, tudo que é pedido pra ela é ofertado. Então, o
que a oposição está fazendo? Está filmando e mandando para as redes sociais
para denegrir a imagem da gestão. É isso, isso não vai… nós temos todas as
provas do jeito que a gente cuida dela e cuidamos muito bem e queremos ver ela
bem, porque ela está fazendo um tratamento muito bem feito e ela vai sair dessa
se Deus quiser”, finalizou.
A secretária, entretanto, não
foi a única pessoa da administração municipal a fazer acusações contra a mulher
que luta contra um câncer desde 2016. O
Água Preta News teve acesso também à conversa de uma pessoa ligada à saúde com
Edvaldo Miranda, que é assessor de Comunicação da prefeita Zulma Pinheiro. No
diálogo, o assessor é categórico ao afirmar que a paciente é usuária de drogas
e dependente de morfina. No momento que viu o primeiro vídeo no qual Ana Paula
faz apelo, pedindo ajuda à população, o assessor disse ter ficado indignado, no
sentido de ter se sensibilizado com as alegações da paciente, mas vê uma
intenção politiqueira no caso.
“Eu fui o primeiro a
perguntar a prefeita e a secretária sobre o caso, pois me doeu muito vendo o
vídeo. Porém, até o momento, não podemos fazer nenhum comentário por se tratar
de uma paciente com vício em drogas e pior, passou a ser dependente de morfina.
Quando não encontra crack, utiliza o medicamento. Uma caixa de remédio para 30
dias ela utiliza em uma semana”, disse o assessor no diálogo.
Contrariando praticamente
tudo o que foi dito pela secretária e pelo assessor, Ana Paula gravou um
segundo vídeo, que o Água Preta News também teve acesso. Veja aqui o primeiro
vídeo.
Nessa nova gravação, também
feita pela sua irmã – e não por “Branca”, como acusou a secretária – Ana Paula
afirmou que não é usuária de drogas, que nunca fez ‘barraco’ na secretaria da
Saúde e que o atendimento que ela recebe da secretaria, na atual administração,
não passa nem perto do que foi dito no áudio pela secretária Renilda Chapéu.
O portal pesquisou sites
renomados na área de oncologia e, ao contrário do que narra a secretária e o
assessor, observa-se que é muito rara a dependência entre pacientes que usam
morfina ou outros opióides, no tratamento da dor do câncer. Isso, claro, com
uso não muito prolongado e sempre monitorado pelo médico.
O que não pode ocorrer é o
paciente parar repentinamente de tomar esse tipo de medicamento ou reduzir a
dose, pois, de acordo com as pesquisas feitas por este portal de notícias, a
parada repentina poderá apresentar sintomas de abstinência, como dor,
ansiedade, náuseas e diarreia. E isso foi o que exatamente ocorreu por diversas
vezes com Ana Paula que, por não ter conseguido a medicação na secretaria, se viu
obrigada a praticamente parar. Outras vezes, Ana Paula recebeu caixas com 50
comprimidos, mas com dosagem de 10 miligramas e não de 30 miligramas, que é a
dose prescrita pelos médicos. Neste caso, a paciente foi obrigada a tomar três
comprimidos de 10 mg por dia, para fazer o efeito de um comprimido de 30
mg. Logo, é matemático que uma caixa
dure apenas pouco mais de duas semanas.
Quanto a abstinência causada
pelos medicamentos opióides, no momento adequado, a redução gradual da dose
reduz também a possibilidade dos sintomas da abstinência e esses sintomas são
um sinal de dependência física e não estão relacionados – de acordo com os
sites pesquisados – ao vício, como deixou transparecer a fala da secretária e
como afirmou claramente o assessor.
Veja o segundo vídeo, no qual
Ana Paula afirma que não é usuária de droga e contesta o apoio que a secretária
disse que a paciente estaria recebendo do poder público
municipal./aguapretanews
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