O presidente do STF (Supremo
Tribunal Federal), Dias Toffoli, abriu a sessão desta quarta-feira (6) com um
recado claro ao presidente Jair Bolsonaro sobre os ataques recentes ao Supremo.
Sem citar o chefe do
Executivo, Toffoli lembrou de frase da pensadora Hannah Arendt e afirmou que a
discordância com decisões da corte deve ser expressada por recursos legais, não
por agressões.
“O poder que não é plural é
violência. Na democracia, divergências são equacionadas nas vias institucionais
adequadas, preestabelecidas na Constituição, a qual dita as regras do jogo
democrático”, disse.
O ministro ressaltou que as
“irresignações” contra decisões do STF devem ocorrer por meios previstos na
legislação, “jamais por meio de agressões ou de ameaça à esta instituição
centenária ou a qualquer de seus ministros”.
Toffoli cobrou coordenação
entre os entes da federação e os três Poderes. “É momento de harmonia, de
equilíbrio e de ação coordenada entre as instituições e os Poderes da
República."
A relação entre o STF e o
Palácio do Planalto ficou abalada após o ministro Alexandre de Moraes suspender
a nomeação de Alexandre Ramagem para o comando da Polícia Federal. Bolsonaro
classificou a decisão como política e questionou se Moraes chegou ao Supremo
por ser amigo do ex-presidente Michel Temer, que o indicou em 2017.
“Eu não engoli essa decisão
do senhor Alexandre de Moraes. Não engoli. Não é essa a forma de tratar o chefe
do Executivo. Tirar numa canetada, desautorizar o presidente da República com
uma canetada, dizendo em impessoalidade? Ontem [terça, 29] quase tivemos uma
crise institucional. Faltou pouco. Eu apelo a todos que respeitem a
Constituição”, disse Bolsonaro no último dia 30.
Esta é a primeira vez que
Toffoli faz uma defesa clara do colega de STF. Semana passada, ministros
rebateram as afirmações de Bolsonaro, mas o presidente da corte havia se
limitado a elogiar Moraes.
O presidente do STF também se
solidarizou com jornalistas que foram agredidos no último domingo (3) durante
um ato organizado por apoiadores de Bolsonaro. Toffoli ainda não tinha
comentado o episódio.
O discurso desta quarta-feira
teve como motivação oficial o registro da importância do Dia Mundial da
Liberdade de Imprensa, comemorado em 3 de maio, justamente a data em que os
jornalistas foram agredidos por bolsonaristas.
Segundo Toffoli, ao agredir
profissionais de imprensa os agressores também atacaram a democracia do país.
“Trata-se de data de elevada
importância em um Estado democrático de Direito, o que torna as agressões ainda
mais lamentáveis e intoleráveis. Por isso, em nome da corte, gostaria de deixar
registrado, na ata desta 10ª Sessão Ordinária do Plenário, o nosso repúdio a
todo e qualquer tipo de agressão aos profissionais da imprensa, devendo a
conduta dos agressores ser devidamente apurada pelas autoridades competentes",
disse.
O presidente do STF ressaltou
que o Brasil teve diversos avanços desde a Constituição de 1988 e que parte da
evolução se deve à imprensa, “que amplia as fronteiras do acesso à informação e
da livre expressão política, intelectual, cultural e científica”.
O ministro ainda elogiou a
cobertura dos veículos de comunicação em relação às consequências do novo
coronavírus.
“Estamos enfrentando uma
pandemia sem precedentes em nosso país, com reflexos dramáticos na vida de
inúmeros brasileiros. A imprensa tem realizado um trabalho de excelência em
auxiliar nas informações necessárias à prevenção da sociedade.”
Toffoli frisou que é
necessário os três Poderes e os entes da federação agirem em harmonia para
evitar o avanço da doença. “Mais do que nunca, é momento de união. Devemos
prestigiar a concórdia, a tolerância e o diálogo, bem como exercitar a
solidariedade e o espírito coletivo."
Leia a íntegra do discurso de
Toffoli:
Discurso em defesa da
Liberdade de Imprensa e do Supremo Tribunal Federal
Abertura da Sessão Plenária
de 6 de maio de 2020
Senhoras e senhores.
No último dia 3 de maio, em
Brasília, profissionais de imprensa foram agredidos quando faziam a cobertura
jornalística de uma manifestação política.
Foram agredidos os
profissionais e foi agredida a democracia. Lembro que, no dia 3 de maio,
celebra-se o Dia da Liberdade de Imprensa. A data comemorativa foi definida
pelas Nações Unidas em homenagem ao art. 19 da Declaração Universal dos
Direitos Humanos, que diz:
“Todo ser humano tem direito
à liberdade de opinião e expressão; este direito inclui a liberdade de, sem
interferência, ter opiniões e de procurar, receber e transmitir informações e
ideias por quaisquer meios e independentemente de fronteiras.”
Trata-se, portanto, de data
de elevada importância em um Estado Democrático de Direito, o que torna as
agressões ainda mais lamentáveis e intoleráveis.
Por isso, em nome da Corte,
gostaria de deixar registrado na ata desta 10ª Sessão Ordinária do Plenário, o
nosso repúdio a todo e qualquer tipo de agressão aos profissionais da imprensa,
devendo a conduta dos agressores ser devidamente apurada pelas autoridades
competentes.
Sem imprensa livre, não há
liberdade de expressão e de informação. Sem imprensa livre, não há democracia.
Desde a Constituição de 1988,
temos assistido o contínuo avanço e fortalecimento das instituições
democráticas brasileiras.
Devemos tais avanços, em
grande medida, à imprensa, que amplia as fronteiras do acesso à informação e da
livre expressão política, intelectual, cultural e científica.
Estamos enfrentando uma
pandemia sem precedentes em nosso país, com reflexos dramáticos na vida de
inúmeros brasileiros.
A imprensa tem realizado um
trabalho de excelência em auxiliar nas informações necessárias à prevenção da
sociedade.
Mais do que nunca, é momento
de união. Devemos prestigiar a concórdia, a tolerância e o diálogo, bem como
exercitar a solidariedade e o espírito coletivo.
É momento de harmonia, de
equilíbrio e de ação coordenada entre as instituições e os Poderes da
República.
As divergências existem, pois
elas são naturais na democracia. Como disse a filósofa Hannah Arendt —e como
venho reverberando—, o poder que não é plural é violência.
Na democracia, as
divergências são equacionadas pelas vias institucionais adequadas,
preestabelecidas na Constituição, a qual dita as regras do jogo democrático.
Recordo que as irresignações
contra decisões deste Supremo Tribunal Federal se dão por meio dos recursos
cabíveis –jamais por meio de agressões ou de ameaças a esta instituição
centenária ou a qualquer de seus ministros.
O Supremo Tribunal Federal é
o guardião máximo da Constituição Federal e das leis. É a última trincheira da
defesa dos direitos fundamentais e dos direitos humanos em nosso país.
Neste momento delicado de
nossa história, esta Suprema Corte segue trabalhando arduamente, por meio de
julgamentos à distância, priorizando a apreciação das questões relativas à
pandemia.
Até há pouco, haviam sido
registrados 1.660 processos e proferidas 1.473 decisões nesta Corte acerca da
pandemia.
Desde o dia 12 de março, o
Tribunal já julgou 3.319 processos colegiadamente, em sessões do Plenário e das
Turmas.
Em sete sessões realizadas
por videoconferência, o Plenário apreciou dezesseis referendos em medidas
cautelares, todas elas relacionadas à pandemia.
Estamos trabalhando para
garantir segurança jurídica ao país, a fim de que cruzemos esse momento
dramático tendo como prioridade a defesa da saúde e da vida das pessoas, aliada
à defesa do emprego e da capacidade produtiva.
Por isso, reitero o que
afirmei, recentemente, neste Plenário: não há solução para as crises fora da
legalidade constitucional e da democracia, ambas salvaguardadas pelo Supremo
Tribunal Federal.
Todos os Poderes da República
e todas as instituições do Estado brasileiro devem atuar dentro dos limites da
Constituição de 1988 e das leis do país e com total respeito aos valores
democráticos./UOL
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