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quinta-feira, 11 de outubro de 2018

Eleitores de Bolsonaro atacam mulher trans com barra de ferro e ameaçam ciclistas na avenida Paulista


Foto publicada nas redes sociais de jovem que diz ter sido

A imagem de uma mulher com um desenho riscado em sua pele foi compartilhada à exaustão em grupos de WhatsApp, no Facebook e no Twitter nesta quarta-feira. Trata-se de uma moradora de Porto Alegre que disse ter sido abordada e agredida por três homens por causa de uma camiseta com a frase "Ele não" que ela usava – a referência é ao movimento de mulheres contra o candidato a presidente Jair Bolsonaro (PSL).

De acordo com a jovem, que não teve seu nome revelado por questões de segurança, o grupo a atingiu com socos e usou um canivete para desenhar uma suástica em sua barriga.

Porém, segundo sua advogada, a jovem "optou por não representar criminalmente. Ou seja, ela não vai dar prosseguimento ao caso em virtude do abalo emocional dela".

O delegado titular da 1ª Delegacia de Porto Alegre, Paulo Jardim, diz que os suspeitos de cometer agressão ainda não foram identificados e o desenho não é um símbolo extremista.

Eleitores de Bolsonaro atacam mulher trans com barra de ferro e ameaçam ciclistas na avenida Paulista

"Eu fui olhar o desenho que fizeram na barriga dela. É um símbolo budista, de harmonia, de amor, de paz e de fraternidade. Se tu fores pesquisar no Google, tu vai ver que existe um símbolo budista ali. Essa é a informação", afirmou em entrevista à BBC News Brasil.

Responsável pelas investigações do caso, Jardim afirmou que a jovem relatou ter sido agredida no início da noite de segunda-feira por três rapazes após descer de um ônibus. "O termo que ela usou foi que riscaram a barriga dela com um canivete e agrediram ela com socos. Ela estava usando uma camisa do 'Ele não'", resumiu o delegado.

Ele criticou a cobertura da imprensa sobre o caso e disse que veículos de comunicação estão "forçando uma barra, insinuando mil e uma situações que não é nada que tem nos autos".

Zalmir Chwartzman, presidente da Federação Israelita do Rio Grande do Sul, não quis comentar as declarações do delegado. "Temos que ter prudência e aguardar as investigações. A insanidade que tomou conta do país é assustadora. Cabe neste momento uma manifestação dos dois candidatos pedindo paz no Brasil. Há gente que faz loucura em nome de Deus, Alá, Moisés, Lula, Bolsonaro, mas o Brasil é maior que as pessoas e os partidos."

Investigação em andamento

O delegado afirmou que a vítima só registrou um boletim de ocorrência cerca de 24 horas após a agressão. "Tomamos conhecimento há mais ou menos uma hora porque ela não registrou na minha delegacia, que é o local do fato. Ela não registrou na área judiciária, que é o centro de tudo. Nem na Polícia Militar foi registrado. Ela registrou na segunda delegacia de polícia ontem de noite. Eu fiquei sabendo do fato porque a mídia começou a me ligar e eu fui correndo atrás", afirmou.

"O que eu tenho é isso. Uma moça agredida que foi riscada na barriga e, pelo desenho que ela expôs na internet, é um símbolo budista, de amor e fraternidade."

Ao ser questionado sobre a motivação de alguém cortar a pele de outra pessoa com um canivete para desenhar um símbolo de amor, o delegado ironizou. "Aí, eu teria de perguntar para esse alguém. Eu seria adivinho e eu não sei adivinhar."

O que diz a defesa da mulher

Gabriela Souza, advogada da garota, afirmou que sua cliente foi atacada gratuitamente por estar com um adesivo com os dizeres "#EleNão" e um arco-íris, um símbolo LGBT. Não houve, segundo relato dela à polícia, citações diretas dos acusados à disputa eleitoral.

"Esse ato homofóbico foi feito com o objetivo de intimidá-la. Ela foi atingida física e emocionalmente. Existe aí um óbvio contexto político subentendido", diz a advogada.

Para Souza, a declaração do delegado sobre a suástica foi precipitada.

"Ele fez uma declaração completamente equivocada num primeiro momento, até porque, entre outras coisas, o comportamento dos agressores é incompatível com o budismo. Mas ao longo do depoimento prestado à tarde ele entendeu a gravidade e a proporção do caso e então passou a dar a atenção correta. O Estado precisa estar preparado. Não pode confundir suástica, símbolo do nazismo, com símbolo de amor, da paz budista, porque é justamente isso que está acontecendo na política atual."

Questionada sobre o trio de suspeitos e o estado de saúde da jovem, a advogada não quis dar mais informações a fim de preservar sua cliente, que não quis conceder entrevista.

Ocorrência 'inédita'

Ainda segundo delegado, é a primeira vez que ele atende a uma ocorrência com essas características. "Eu não tenho notícia de fato semelhante. É inédito", diz.

Mulher em protesto contra Bolsonaro

Jardim contou que a jovem foi encaminhada ao Instituto Médico Legal (IML) para fazer exame de lesão corporal. O laudo deve ficar pronto nos próximos dias.

"Foi um delito de pequeno poder ofensivo, uma lesão leve, e nós vamos fazer um termo circunstanciado", afirmou o delegado responsável pelo caso.

Ele diz que a polícia está "procurando imagens, testemunhas, e estamos batendo nas casas para ver se alguém testemunhou alguma coisa". O delegado disse ainda que vai ouvir a jovem, o que ainda não havia ocorrido.

Segundo a assessoria de imprensa do Ministério Público estadual gaúcho, não foi registrado nenhum caso recente relacionado a atos neonazistas no Estado.

O MP-RS destaca, ao mesmo tempo, que, em setembro, foram condenados em Porto Alegre três homens por tentativa de homicídio triplamente qualificado, após terem agredido a facadas, socos e pontapés, em 2005, três jovens que usavam um quipá (símbolo judaico). Os condenados faziam parte do grupo skinhead Carecas do Brasil, segundo a Promotoria.

Como a suástica foi adotada pelo nazismo?

A suástica tem origens complexas e, antes dos nazistas, foi usada por diferentes religiões e culturas, diz a antropóloga Adriana Dias, cuja tese de doutorado explorou o movimento neonazista. Segundo ela, gregos, hindus, celtas e até os nativos americanos utilizaram o símbolo com diferentes fins.

O historiador e jornalista Marcos Guterman, autor do livro Nazistas entre Nós, explica que os primeiros traços do símbolo surgiram nas culturas orientais. No contexto do sânscrito, ele significa boa fortuna ou boa sorte e pode ser encontrado em diversas religiões asiáticas, inclusive o budismo. Por isso é fácil ver representações como essas em templos.

No entanto, apesar de reconhecerem que a suástica tem outras aplicações, ambos descartam que o desenho na foto da jovem de Porto Alegre signifique algo como "paz e amor".

"Existe essa relação religiosa, mas neste caso claramente não se trata disso. A agressão é diretamente relacionada com o nazismo. Não precisa ser policial para saber", diz Guterman.

Suástica

Ele diz que a suástica se fortaleceu na Alemanha no começo do século 20, quando foi adotada por movimentos ultranacionalistas. A partir daí, os nazistas conheceram o símbolo e o divulgaram como uma de suas marcas.

"A Alemanha tinha sido unificada há pouco tempo e era uma afirmação nacional, uma representação idealizada do passado."

Sobre o argumento de que o desenho está ao contrário e por isso não seria o símbolo nazista, Dias diz que os membros do partido usavam suásticas em diferentes inclinações e tamanhos, e que ela era apenas um entre mais de 500 elementos da simbologia adotada por eles.

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"(Um dos principais líderes do partido nazista) Heinrich Himmler, que teve a ideia do roubo das grandes obras de arte nos países ocupados, tinha em seu castelo no Nordeste da Alemanha uma suástica com a mesma rotação que a desenhada na menina."/portuguese

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