O artista plástico Frans
Krajcberg morreu nesta quarta-feira, aos 96 anos. Ele estava internado há um
mês no Hospital Samaritano, na Zona sul do Rio. O quadro de saúde do artista
era considerado frágil, e ele chegou à capital fluminense com várias infecções.
Na Bahia, onde vivia, ele chegou a ser hospitalizado em Teixeira de Freitas,
uma cidade próxima a Nova Viçosa, onde fica seu sítio e futuro museu.
O corpo do artista foi
levado, na tarde desta quarta-feira, para um laboratório no Rio. Ele será
cremado, de acordo com o desejo do mesmo. Como contou Marcia Barrozo do Amaral,
uma das amigas mais próximas de Krajcberg, as cinzas serão levadas até o Sítio
Natura, em Nova Viçosa.
Conhecido principalmente por
suas esculturas feitas a partir de troncos e raízes de árvores calcinadas pelos
incêndios que derrubam densas áreas verdes para transformá-las em pastos,
Krajcberg sempre foi um artista engajado. Sua obra transitou pela pintura,
escultura, gravura e fotografia.
"É preciso falar sobre a
destruição do planeta. E é preciso falar sobre cultura" disse ele em
entrevista ao GLOBO, em 2015. "Estamos passando por momentos difíceis, tem
um vazio de arte, não se pronuncia mais a palavra cultura. É uma crise mundial,
mas no Brasil parece estar mais profunda. Porque aqui, também se trata de uma
crise moral".
Brasileiro desde 1957
("A imprensa insiste em dizer que sou polonês naturalizado brasileiro; não
sou. Sou brasileiro", observa), ele nasceu em Kozienice, Polônia, em 11 de
abril de 1921. Antes da guerra, estudou engenharia e artes na Universidade de
Leningrado. Chegou aqui em 1948, depois de lutar na Segunda Guerra, onde toda a
sua família, de origem judia, foi dizimada no Holocausto.
"Perdi toda a minha
família de modo bárbaro. Sabe o que é isso? Fazer um buraco enorme, jogar eles
vivos, jogar terra em cima? Não suportava mais viver. Fiquei sozinho, quis
fugir de tudo, principalmente do homem", disse.
A exuberante natureza do novo
país lhe deu o refúgio que buscava. Em 1951, participou da 1ª Bienal
Internacional de São Paulo com duas pinturas. Residiu por um breve período no
Paraná, isolando-se na floresta para pintar. Em 1956, mudou-se para o Rio de Janeiro,
dividindo o ateliê com o escultor Franz Weissmann (1911-2005). Dois anos
depois, revezava-se entre o Rio, Paris e Ibiza.
Em 1972, fixou residência em
Nova Viçosa, no Sul da Bahia, onde viveu até o fim da vida, no Sítio Natura,
cercado pela única porção de Mata Atlântica remanescente na região, e que tomou
para si a tarefa de manter intacta. Krajcberg estava construindo um museu para
abrigar suas obras, que calculava serem em torno de 300. Segundo Marcia Barrozo
do Amaral, o museu está próximo de ficar pronto, faltando apenas dois
pavilhões.
"Lá é o lugar que ele
adotou para viver. Tudo no sítio tem o dedo dele. É um terreno muito grande,
tem a Casa da Árvore, que ele gostava de chamar de "Casa do Tarsan".
Ele vivia nela. Ao lado, ficam os dois pavilhões que constituem o museu",
explicou Márcia.
Apesar de o projeto estar
próximo de ser realizado, assim como Krajcberg desejava, em vida ele reclamava
da falta de apoio.
'Lá no Sul da Bahia não me
dão nem bom dia. Não sei o que vou fazer. Venho trabalhando sozinho, não sei se
tenho mais forças ", dizia, com a mágoa ampliada pelos cinco assaltos que
sofreu: num deles, levaram o cordão, que era a única lembrança que guardava de
sua mãe (depois do último roubo, três policiais militares revezavam-se na segurança
da propriedade e do artista).
Seu trabalho com escultura,
iniciado em Minas Gerais, intensificou-se na Bahia. Viajava constantemente para
a Amazônia e Mato Grosso e fotografava os desmatamentos e queimadas, revelando
imagens dramáticas. Dessas viagens, retornava com matéria-prima natural para
suas obras.
Durante a Segunda Guerra
Mundial (1938-1945) em 1939, Krajcberg buscou refúgio na União Soviética, onde
estudou engenharia e artes na Universidade de Leningrado. Residiu na Alemanha
prosseguindo seus estudos na Academia de Belas Artes de Stuttgart.
Chegou ao Brasil em 1948,
vindo a participar da oitava Bienal de São Paulo, em 1951. Durante a década de
1940 o seu trabalho era abstrato.
De 1948 a 1954 viveu entre as
cidades de Paris, Ibiza e Rio de Janeiro, onde produziu os seus primeiros
trabalhos fruto do contato direto com a natureza. Na década de 1950 morou em
uma caverna no Pico da Cata Branca, região de Itabirito, no interior de Minas
Gerais. Ali na região, à época, era conhecido como o barbudo das pedras, uma
vez que vivia solitário, sem conforto, tomando banho no rio vizinho, enquanto
produzia, incessantemente, gravuras e esculturas em pedra.
Em 1956, mudou-se para o Rio
de Janeiro, onde dividiu o ateliê com o escultor Franz Weissmann (1911 - 2005).
Naturalizou-se brasileiro no ano seguinte.
Em 1964, executou as suas
primeiras esculturas com madeiras de cedros mortas. Realizou diversas viagens à
Amazônia e ao Pantanal Matogrossense, fotografando e documentando os
desmatamentos, além de recolher materiais para as suas obras, como raízes e
troncos calcinados. Na década de 1970 ganhou projeção internacional com as suas
esculturas de madeira calcinada.
A sua obra reflete a paisagem
brasileira, em particular a floresta amazônica, e a sua constante preocupação
com a preservação do meio-ambiente. Atualmente, o artista tem se dedicado à
fotografia.
O sítio Natura
Krajcberg radicou-se no
Brasil desde 1972 vivendo no sul da Bahia, onde manteve o seu ateliê no Sítio
Natura, no município de Nova Viçosa. Chegou ali a convite do amigo e arquiteto
Zanine Caldas, que o ajudou a construir a habitação: uma casa, a sete metros do
chão, no alto de um tronco de pequi com 2,60 metros de diâmetro. À época Zanine
sonhava em transformar Nova Viçosa em uma capital cultural e a sua utopia
chegou a reunir nomes como os de Chico Buarque, Oscar Niemeyer e Dorival
Caymmi.
No sítio, uma área de 1,2
km², um resquício de Mata Atlântica e de manguezal, o artista plantou mais de
dez mil mudas de espécies nativas. O litoral do município é procurado,
anualmente, no inverno, por baleias-jubarte. No sítio, dois pavilhões
projetados pelo arquiteto Jaime Cupertino, abrigam atualmente mais de trezentas
obras do artista. Futuramente, com mais cinco construções projetadas, ali se
constituirá o Museu que levará o nome do artista.
Ativismo ecológico[editar -
Ao longo de sua carreira, o artista:
Denunciou queimadas no estado
do Paraná;
Denunciou a exploração de
minérios no estado de Minas Gerais;
Denunciou o desmatamento da
Amazônia brasileira;
Defendeu as tartarugas
marinhas que buscam o litoral do município de Nova Viçosa para desova;
Postou-se na frente de um
trator para evitar a abertura de uma avenida na cidade de Nova Viçosa.
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