Quase um mês após o resgate, a jovem mantida em cárcere privado pelo próprio tio, de 43 anos, falou pela primeira vez, nesta sexta-feira (18), sobre o caso e como se sentiu durante cerca de uma década em que estave afastada da família. A jovem é de Rio Bananal, no Norte do Espírito Santo e foi mantida em cativeiro no Sul da Bahia.
O suspeito se entregou à Polícia Civil nesta segunda-feira (14).
Tanto para ela, como para os
pais e o irmão, a rotina foi de tristeza e medo mesmo após a volta para casa, uma
vez que, ameaças estavam sendo feitas pelo, até então, foragido. Com a prisão
do tio, a expectativa dela é de que os dias voltem a seguir uma normalidade.
A jovem, atualmente com 25 anos, contou que já está recebendo visitas.
“Agora, eu posso sair, ver as pessoas, as pessoas também podem vir me ver. Tinha muita gente que queria, mas não vinha me ver por medo, porque ele tava solto ainda”, disse.
Agredida e violentada
Ela confirmou que vivia trancada e era impedida de estudar e receber visitas. Não podia sair desacompanhada e era agredida e violentada com frequência.
Em um dos estupros, a sobrinha chegou a engravidar, mas o bebê morreu 21 dias após o parto.
“Eu fazia de tudo para conseguir sobreviver naquele lugar, eu passei muito tempo mal, muito, muito tempo, isso feriu o meu psicológico e hoje eu vou ter que fazer até acompanhamento com psicóloga, para conseguir levar uma vida normal”, contou.
Segundo a vítima, o tio vivia dizendo que a família a tinha rejeitado, e ela não fazia ideia que, durante todos esses anos, o pai nunca desistiu de encontrar a filha.
"Eu parei porque não tinha mais condições de correr atrás, mas, desistir jamais. Chorava muitas vezes rezando por ela, e Deus me ouviu”, disse o pai emocionado.
Desde que voltou para casa, a jovem está sendo acompanhada pela rede pública de saúde. Ela passou por uma série de exames, fez consultas com psicólogo e psiquiatra. Até então, não foi necessário iniciar nenhuma medicação.
Impedida de estudar
A expectativa é que agora, com a prisão do suspeito, a mulher comece a se sentir mais segura e aos poucos volte a pensar no futuro.
“Até hoje eu sonho em terminar os estudos e eu vou conseguir. Ele não deixava eu ir, era um lugar onde eu poderia conseguir ajuda, né?”, contou.
A sobrinha também espera que a sua história seja um motivo de força para que outras mulheres não tenham medo de pedir ajuda.
“Tenha coragem, você é a única pessoa que pode conseguir te tirar dessa vida ruim que você tá levando, e que nada disso é culpa sua”, reforçou a vítima.
Ameaças à família
As grades nas portas e nas janelas da casa da família em Rio Bananal são o lembrete do medo que estavam sentindo. De acordo com o pai da vítima, mesmo sendo procurado pela polícia, o suspeito continuou a fazer ameaças.
“Eu passei várias noites
acordado e o tive que ligar para um amigo meu que mexe com ferragem. Ele fez as
grade de imediato, peguei um dinheiro emprestado para pagar, fiz o serviço,
botei as grades nas janelas e nas portas para eu conseguir dormir”, desabafou.
“Que a justiça aja do jeito que ele merece. Porque ele merece ficar na prisão e não solto. Ele é um monstro. Ele não é um ser humano”, afirmou.
A menina também falou sobre a possibilidade de outras pessoas saberem da sua situação.
“Dava para ver que eu não estava bem, dava para perceber que tinha alguma coisa de errada acontecendo”, falou.
Suspeito nega acusações
De acordo com o inquérito policial, o suspeito saiu de Minas Gerais e chegou a Rio Bananal, no Espírito Santo, em 2014, para trabalhar. Ele foi acolhido pela família e, pouco tempo depois, começou a abusar da menina, na época com quinze anos. Até que, dois meses depois, sequestrou a própria sobrinha.
O delegado Fabrício Lucindo, que investiga o caso, disse que o tio foi ouvido e apresentou provas para tentar provar que a sobrinha não estava em cárcere privado.
“Ele disse que a moça não estava sobre cárcere privado, tentou apresentar algumas provas daquilo que ele estava falando, como fotografias, extratos bancários, e outras provas. Tudo isso vai ser juntado ao inquérito policial e a justiça vai avaliar, no final, se ele deve ou não permanecer preso, se deve ou não ser condenado pelo crime”, apontou.
Sobre a possibilidade do homem ter cúmplices, o delegado disse que isso ainda não foi relatado à polícia, mas não descartou uma investigação se for necessário, e com responsabilização de outras pessoas se for o caso.
O homem foi preso e encaminhado para o Centro de Detenção Provisória da Serra, na Grande Vitória.
A defesa do tio informou que a denúncia de cárcere privado foi fabricada pela vítima e que os dois viviam como um casal.
A jovem foi sequestrada aos 15 anos em Rio Bananal, no norte do Espírito Santo, e levada para Teixeira de Freitas, no extremo sul da Bahia. Na época, ela deixou uma carta para a família.
Ao chegar a Bahia, passou a ser deixada trancada em casa. O suspeito dizia que se ela tentasse fugir, mataria ela e a família. Desde então, só saía de casa acompanhada do suspeito e era vigiada todo o tempo e não permitia que ela fosse à escola e era constantemente agredida fisicamente.
O suspeito monitorava conversas ocasionais dela com outras pessoas. Tio e sobrinha viajavam apenas de carro, nunca de ônibus.
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A ação da polícia que encontrou a jovem recebeu o nome de "Operação Resgate" e foi coordenada pela Superintendência de Polícia Norte e da 16ª Delegacia Regional de Linhares, com o apoio da Delegacia de Polícia (DP) de Rio Bananal e da Promotoria de Justiça de Rio Bananal.
A vítima relatou que, durante esses anos, sofreu abusos sexuais, era mantida trancada e sob ameaças de morte, inclusive contra seus familiares, caso tentasse escapar. Também era forçada a trabalhar na roça.
"Ele a vigiava o tempo
todo e nunca permitiu que ela frequentasse a escola. A vida dela era
completamente controlada por ele. A vítima passou por vários locais, incluindo
a capital Vitória, onde viveu por três anos, antes de ser levada para Jucuruçu.
Durante todo o tempo, ela foi obrigada a trabalhar na roça e recebia apenas R$
100,00 por mês”, afirmou o delegado Fabrício Lucindo./g1.globo
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