Medioli:
com 350 milhões de reais, ele tem o dobro da fortuna do paulistano João Doria
O empresário Vittorio Medioli
se empoleira no banco de trás de um Fiat Palio Weekend 2009 e fala animado. Com
150.000 quilômetros rodados e avaliado em pouco menos de R$ 30 mil, o carrinho
verde chacoalha quando passa pelas lombadas de Betim, em Minas Gerais, a
caminho do parque ecológico Vale Verde, onde fica um restaurante simples onde
Medioli costuma almoçar.
A blindagem do velho Weekend
é o único luxo. “Eu acho que quando se pode entrar em uma concessionária e
comprá-la inteira com um cheque, ostentar não faz sentido”, diz.
Vittorio, espremido entre a
mulher Laura e uma assessora, eleito para comandar Betim pela primeira vez em
outubro. De acordo com a declaração feita para a Justiça Eleitoral, sua fortuna
é de pouco mais de R$ 350 milhões, quase o dobro dos 180 milhões declarados
pelo badalado prefeito de São Paulo, João Doria.
Ele é dono do Grupo Sada, uma
companhia de logística que investiu em setores como siderurgia,
biocombustíveis, editorial, concessionárias de automóveis e até em um time de
vôlei. No ano passado, o Sada faturou R$ 3 bilhões.
O Vale Verde produz, entre
outras coisas, uma das mais premiadas cachaças do Brasil, mas, desde 1994,
Vittorio não coloca uma gota de álcool na boca. Naquele ano, descobriu ser
portador de hepatite C, que resultou numa cirrose e degenerou seu fígado.
Em junho de 2011, foi
internado no hospital Albert Einstein, em São Paulo, de onde só saiu seis meses
depois, pesando 43 quilos e com um fígado transplantado. Ao todo, morou um ano
e meio em São Paulo durante seu tratamento.
Chegou a repassar para suas
filhas, Marina Medioli, na época com 22 anos, e Daniela Medioli, com 21, as
instruções para o futuro das empresas. Foi dentro do Einstein que o ex-deputado
federal por quatro legislaturas (esteve na Câmara entre 91 e 2006) decidiu que
queria voltar para a política. Cinco anos depois, foi eleito prefeito de Betim
pelo pequeno PHS numa coligação de 15 partidos, com aliados que vão do PSDB ao
PC do B.
O Doria de Minas?
Seja pela riqueza ou pelo
histórico como empresário, Medioli vem sendo comparado ao prefeito de São
Paulo, João Doria, o que não o deixa exatamente feliz. Medioli também não
recebe salário, mas critica a maneira como Doria divulga suas ações. “Não faço
proselitismo. Poderia fazer uma cerimônia para dar um cheque para uma entidade,
mas isso não é inteligente”, diz.
Nas contas do prefeito
mineiro, deixar o dinheiro no caixa da prefeitura dobra o valor economizado, já
que não são descontados impostos e outras contribuições.
Assim como Doria, o prefeito
de Betim tenta levar um pouco da agilidade da gestão empresarial para a
prefeitura, mas esbarra nas especificidades do setor público.
Quando assumiu, uma das
Unidades de Pronto Atendimento tinha apenas três de 33 medicamentos que
deveriam ser distribuídos para os pacientes. O processo para compra seria
moroso e levaria, ao menos, algumas semanas. Medioli fez um cheque e pagou do
próprio bolso os remédios. A história, que não é pública, não teve parecer da
procuradoria do município.
Entre os políticos, não e só
Doria que o prefeito de Betim critica. Dos seus tempos de Brasília, um dos
únicos poupados é Fernando Henrique Cardoso, “uma pessoa inteligente e ética”.
Mesmo crítico ao PT,
atualmente é próximo do governador de Minas, Fernando Pimentel, investigado
pela Lava-Jato e denunciado pela Acrônimo, acusado de receber pelo menos R$ 20
milhões em propinas. “Tenho uma relação ótima. Me manda WhatsApp direto”, diz.
Interlocutores petistas confirmam.
A maior mágoa sobra para seu
ex-partido, o PSDB. O prestígio entre os tucanos não cresceu na mesma proporção
de seus votos no estado, o que o fez mudar para o PV em 2005. Em 1989, ele
escolheu se filiar aos sociais-democratas porque achava que eles tinham um
padrão parecido com a esquerda europeia, com a qual se identifica.
Decepcionou-se.
Dos ex-correligionários, o
mais criticado é o senador e ex-governador do estado, Aécio Neves. “Ajudei-o
muito mais do que ele me ajudou. Acreditei que faríamos algo diferente por
Minas, mas foi só teatro”.
Um italiano no Brasil
Como prefeito de Betim, Medioli
senta na sala mais distante da entrada da prefeitura, impondo uma longa
caminhada a quem chega para encontrá-lo. A prefeitura fica na antiga fábrica da
Cerâmica Saffran, que foi remodelada durante o governo do PT (2009-2012), com
passarelas de metal pintadas de verde e amarelo, mas continua barulhenta como
se ali ainda funcionassem fornos para queimar barro.
Vozes, buzinas e até o
barulho do trem que corta a cidade são presentes no ambiente de trabalho. A
mesa, trazida de sua sala na Sada, fica praticamente vazia, assim como o
gabinete, feito de antigas divisórias de Eucatex.
Nascido em Parma, na Itália,
em uma rica família dona de moinhos de farinha, Medioli veio para o Brasil em
1976 a convite da Fiat. A montadora italiana ia começar a operar sua primeira
fábrica por aqui e queria trazer fornecedores de confiança de seu país de
origem. A Sada era uma pequena empresa de transportes que prestava serviço de
logística para outros fornecedores da Fiat na Itália e veio na esteira.
Vittorio, então com 24 anos,
havia cursado Filosofia e Direito e nunca se formara, foi convocado pela
família a explorar novas terras. A transportadora se instalou na região de
Betim. Pouco depois, a família desistiu de investir no país e Medioli ficou
sozinho.
A Sada foi crescendo
lentamente, junto com a Fiat. A fábrica da montadora em Betim, que nasceu para
fazer 200.000 veículos ao ano, chegou a produzir mais de 800.000, tornando-se a
segunda maior fábrica de automóveis do mundo, atrás apenas de uma planta da
Hyundai, na Coréia do Sul. Medioli estava na hora certa, no local correto.
Além de se tornar responsável
pela logística de todos os carros que saem de fábricas da Fiat no país, a Sada
começou a prestar serviço para outras montadoras, principalmente no ABC
paulista. Medioli chegou a ter 55% do mercado da logística de automóveis no
Brasil e encerrou 2016 com 44% de participação.
O faturamento total do grupo
chegou a R$ 4,2 bilhões em 2013, com mais de 9.000 funcionários. Mas a crise
não atingiu só a prefeitura e, em 2016, a receita caiu para pouco menos de 3
bilhões, enquanto o número de funcionários foi a 7.400.
Nem o momento delicado fez
Vittorio desistir da prefeitura. “Para a família, ele negou que ia se
candidatar enquanto podia, mas a gente sabia que era a vontade dele”, diz a
filha Daniela, hoje diretora-executiva do grupo. Com a ida de Vittorio para a
prefeitura, as filhas Marina e Daniela passaram a comandar os negócios.
O crescimento fez a companhia
se expandir para outros setores, de siderurgia a um grupo editorial – comandado
pela mulher, Laura Medioli. A empreitada nasceu de uma vontade de Laura, que
fazia um jornalzinho gratuito para distribuição no projeto social que tocava.
Em 1996, Medioli comprou o O Tempo, que então era um pequeno jornal de
circulação somente em Betim, e deu para a esposa como presente de aniversário
de casamento.
Agora mais recente o
milionário está investindo numa emissora de rádio (Super Notícias), com o
objetivo de concorrer com a poderosa Itatiaia./Exame
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