Dia do Protesto
Protestar implica em comprometer-se publicamente, expor as razões de uma causa, e possivelmente lutar por ela. Um dos protestos mais marcantes da história foi o movimento conduzido pelo líder pacifista indiano, Mahatma (o Grande Alma) Gandhi. Para libertar a Índia do domínio britânico ele conduziu vários protestos pacifistas, entre eles a Marcha para o Mar (1930): uma caminhada de mais de 320 quilômetros, seguida por milhares de pessoas, contra os impostos britânicos sobre o sal.
Se os seus direitos foram violados de qualquer modo, não hesite: proteste!
Se foi vítima (ou testemunha) de uma injustiça - qualquer que ela seja, desde ter sido enganado numa loja a ter sido espancado por um policial - corrija-a! Ou pelo menos tente. Por si e pelos outros.
Denuncie a situação enviando uma reclamação ou um requerimento, ou, melhor ainda, junte-se a uma das inúmeras associações que tentam fazer algo - pode contribuir com o seu trabalho ou, simplesmente, com dinheiro (ambos sempre bem-vindos).
Mas pelo menos mande-lhes um email de protesto!
Muitos no passado lutaram para que o direito de protestar fosse hoje uma realidade garantida pela Constituição. Muitas dessas pessoas perderam suas vidas, é verdade. Mas acreditaram que algo precisava ser mudado, e não cruzaram os braços diante das dificuldades.
Ninguém precisa virar ativista de carteirinha, ou radicalizar de qualquer forma. Simplesmente exija o que lhe é de direito. E deixe o mundo saber se você pensa que algo está errado e pode fazer alguma coisa para mudar o quadro!
Protestar não é crime; é um direito.
Educar um povo a não reclamar pelos seus direitos, é na minha opinião, um crime, da mesma maneira que considero que educar alguém que está a ser atacado a não defender-se, é crime.
Educar um povo a não reclamar pelos seus direitos, é na minha opinião, um crime, da mesma maneira que considero que educar alguém que está a ser atacado a não defender-se, é crime. Sou da opinião sincera que o direito de protesto, de manifestação ou de reclamação (que no fundo dá no mesmo) deve ser um exercício legal a ser exercido por qualquer cidadão que sinta que os seus direitos cívicos ou constitucionais estão a ser usurpados, ou pelo menos, não estejam a ser garantidos.
O que faz diferença é a maneira de se protestar. Existem protestos violentos, e protestos pacíficos. Dependendo da capacidade, habilidade ou disposição de um determinado regime dialogar ou não com a parte protestante, as manifestações podem terminar em ações violentas e descontroladas, ou prosseguir pacificamente.
Estou ainda a recordar-me da manifestação levada a cabo pelos nossos compatriotas angolanos no dia 4 de janeiro de 1961, na baixa de Cassanje em Malange.
O móbil da manifestação (também podemos lhe chamar de protesto porque dá tudo no mesmo), era a proibição do cultivo da mandioca (um alimento tipicamente africano) e a obrigatoriedade do cultivo do algodão e o aumento dos impostos deste, pela companhia belga colonial, a Cotonang.
A reação das autoridades coloniais portuguesas foi imediata e muito violenta: usando aviões que descarregavam bombas napalm sobre uma população indefesa, causaram a morte de milhares de pessoas. Este acontecimento hediondo causou tanta revolta entre os angolanos que serviu de ignição para o inicio da luta armada iniciada um mês depois, a 4 de fevereiro de 1961.
Atualmente comemoramos em Angola todo o dia 4 de Janeiro como um feriado oficial nacional, em memória das vítimas. Nunca antes na história de Angola se verificou uma manifestação daquela magnitude, que era, no considerar dos colonos portugueses da altura, uma açao impossível ou impensável da parte dos autóctones angolanos.
Com a independência nacional entramos numa outra era, em que os angolanos autóctones finalmente controlariam os seus próprios destinos, e um dos motivos que guiou a luta anti-colonial era luta contra a exploração dos angolanos por outros povos, nesse caso os portugueses.
A exploração, a usurpação das riquezas da terra, a usurpação da nossa identidade africana e o resgate da nossa dignidade, dos nossos valores, da nossa cultura e línguas africanas, e principalmente, da nossa liberdade e da nossa terra seriam os frutos da nossa independência. Pelo menos era assim que os angolanos que lutaram de verdade contra o colonialismo pensaram.
Passados 35 anos e olhando para trás, verificamos que os ganhos da nossa independência ainda são uma miragem para a maioria dos angolanos, especialmente dos angolanos autóctones que agora ficaram constitucionalmente sem terra (passou a ser propriedade do estado).
Verificamos que as imensas riquezas do nosso país, ainda não servem a maioria dos angolanos, mas também é propriedade privada só de alguns. Com um governo super centralizado como o nosso, as riquezas do país e o seu dividendo se concentram sempre nas mesmas pessoas, num ciclo vicioso que deu lugar a uma corrupção que praticamente já se tornou institucional. A polícia angolana reprime tanto ou pior que a PIDE-DGS, ao em vez de ser uma entidade protetora dos cidadãos, torna-se cada vez mais uma entidade apenas ao serviço de uma pequena elite.
A maioria dos angolanos sente-se estrangeiro neste país que cada dia que passa enterra a africanidade e desenha uma angolanidade também atípica, tal como a nossa constituição, em que nela o angolano autóctone se revê como estrangeiro dentro da sua própria terra. Nem as nossas línguas nativas foram oficializadas nesta nova constituição, mas apenas o português, que é uma língua imposta pelo colonialismo.
Nos encontramos debaixo de uma governação que administra os recursos de um país mas sem prestar contas aos seus verdadeiros donos: o povo.
A maioria dos nossos líderes se tornou arrogante e insensível demais perante o sofrimento dos angolanos, vivem num mundo só deles enquanto pregam em órgãos como o Jornal de Angola e outros que Angola está a mudar, estamos a crescer, somos os maiores, somos os melhores, etc.
De certeza que a analise dos nossos dirigentes é feita de um prisma totalmente egocêntrico, esquecendo-se que o maior indicador do crescimento de um país é a qualidade de vida do povo, o acesso aos serviços de saúde, de educação, do emprego. E vivendo num país riquíssimo como Angola, em 35 anos de independência e 9 anos de paz, já era altura de começarmos a falar também de subsídio de desemprego, entre outros benefícios de uma cidadania plena.
Vemos o contrário disso. O acesso aos recursos e benefícios do país para além de serem limitados só para alguns (baseado nos nomes e classe social, e em alguns casos até na cor da pele), em muitos casos, para ter acesso a um benefício como uma bolsa do Inabe te pedem Cartão de Militante de um partido angolano. Este partido chama-se MPLA.
Isto é só para mencionar um exemplo em que, para se ter o benefício de algumas coisas em Angola o cartão de Militante do MPLA se torna numa obrigatoriedade, mas há mais. E ninguém pode negar esta realidade. Diante desta situação, me questiono como é com aqueles que são militantes assumidos de outros partidos e estão lá mesmo por uma razão ideológica. Será que estes têm de adquirir o cartão da angolanidade plena (Cartão do MPLA) para usufruir de alguns benefícios enquanto militam também clandestina ou abertamente nos seus partidos ou renunciam a atividade política nos seus partidos? Curiosidade.
Estas situações todas e muitas outras, considero muito injustas e justificariam um protesto massivo da população nas ruas da capital angolana e não só. Um protesto contra leis injustas e medidas anti-sociais. E dizer isto não é crime nenhum, porque se fosse crime, a nossa constituição não plasmaria este direito no seu artigo 47 (atenção, estou a defender o direito de se manifestar pacificamente).
Infelizmente, principalmente nos governos africanos, as manifestações pacíficas quase nunca geram frutos nenhuns, já que os dirigentes se mantêm insensíveis, e chegam até a ser reprimidas, muitas vezes com tanta brutalidade que nos traz á memoria a repressão brutal dos regimes coloniais. Os manifestantes passam a ser tidos como inimigos da pátria, anti-patriotas, vândalos, agentes de forças externas, etc.
Este fato é que leva, muitas vezes, às manifestações violentas como meio de se alcançar um objetivo. No caso de Moçambique a “revolta dos pobres” expôs o fracasso das políticas económicas e sociais do governo. Felizmente o Presidente Armando Guebuza teve o bom senso de recuar nas decisões iniciais do governo que deram inicio à revolta dos moçambicanos. É caso para se dizer “quem não chora, não mama”.
Me pergunto: como seria se tivesse sido em Angola? Como teriam reagido as autoridades? Teriam reagido com a mesma brutalidade (ou pior) que a policia moçambicana? Como teriam reagido os nossos irmãos que se auto-proclamaram a “vanguarda do povo angolano”, o MPLA? Nos defenderiam? Estariam ao lado do povo ou os teriam considerado como inimigos? Porque seria um contra-senso um partido que diz ser representante do povo (o povo é o mpla e o mpla é o povo) considerar o mesmo povo como inimigo apenas porque exteriorizou o seu desagrado perante a governação do país através de um protesto.
Temos de interiorizar que protestar não é um crime, é um direito. Angola é de todos os angolanos e todos merecemos, temos o direito, de usufruir dos benefícios da nossa cidadania. Todos temos direito de viver bem na nossa terra, e de termos as mesmas oportunidades. Até mesmo o direito de escolher os nossos dirigentes deve ser um direito sagrado e não um crime lesa pátria. E nós, os angolanos “comuns”, não adianta pensar que este governo que está aí, já a 35 anos, vai satisfazer os nossos anseios apenas pelos nossos lindos olhos.
A historia tem demonstrado que quanto mais tempo um partido permanece no poder, mais ele se acomoda, porque criam-se vícios que depois são difíceis de combater. Tem de ser nós mesmos, a pressionar e a exigir que os nossos direitos sejam satisfeitos e garantidos, como demonstrou mal ou bem, o povo moçambicano.
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