"Onde estava a
sororidade das jornalistas e dos jornalistas da grande mídia quando Marisa
faleceu em decorrência de todo esse processo político, jurídico e midiático que
a Lava Jato criou? Não só não houve apoio como o assunto pareceu proibido",
diz a jornalista Cíntia Alves sobre os ataques da mídia ao depoimento do
ex-presidente Lula ao juiz Sérgio Moro; "O feminismo (de ocasião) se
recolheu, ainda, quando delatores passaram a dizer que Marisa pediu reforma em
sítio, mas era segredo. Pediu reforma em triplex, mas era segredo. Pediu
terreno para Instituto Lula, mas era segredo. Ninguém presenciou a reunião, só o
delator e Marisa", afirmou
Cíntia Alves, Jornal GGN -
Quem teve a oportunidade de visualizar as capas dos principais jornais
impressos, nesta quinta-feira (11), pôde identificar um esforço sincronizado de
veículos da grande mídia para estabelecer uma narrativa hegemônica que pudesse
reduzir quase cinco horas de depoimento do ex-presidente Lula ao juiz Sergio
Moro à uma derrota do petista.
Lula teria recorrido ao
"não sei de nada" desgastado pelo Mensalão e jogado a culpa do
triplex no colo de dona Marisa, dizem as manchetes dos jornalões, em letras
garrafais. Como se a democratização das informações pela internet ainda
permitisse esse tipo de manipulação.
Certo é colocar Lula como o
marido que se aproveitou da morte da esposa para sair pela tangente em relação
ao triplex motivou algumas manifestações vergonhosas publicadas. Três delas
estão no Estadão, travestidas de jornalismo, mas subestimam a inteligência do
leitor.
Primeiro, uma entrevista com
o procurador Carlos Fernando dos Santos Lima, do time da Lava Jato, que
aproveitou a onda midiática que explora as falas de Lula para dizer que:
"Infelizmente, as afirmações em relação à dona Marisa a responsabilizando
por tudo é um tanto triste de se ver feitas nesse momento, até porque, como o
ex-presidente disse, ela não está aí para se defender."
Fica a pergunta: quem
arrastou dona Marisa para esta ação penal foi Lula ou a força-tarefa do
Ministério Público Federal?
Lula não jogou apartamento no
colo de Marisa como se ela não tivesse tido participação ativa no enredo
contado pelos próprios procuradores da Lava Jato.
O nome da ex-primeira-dama
consta na aquisição de uma cota parte de um dos empreendimentos da Bancoop no
litoral paulista, cota esta que está na raiz do caso triplex.
Marisa era a compradora
oficial, não Lula.
Foi ela quem pediu
ressarcimento na Justiça quando não quis mais um imóvel do projeto
posteriormente tocado pela OAS.
Também foi Marisa quem
visitou duas vezes o triplex, uma ao lado de Lula, que disse a Moro que o
espaço era "inadequado para a família" e, por isso, ele não apoiava a
compra. Se Marisa ainda pensava em comprar, disse Lula, é "possível"
que ela tivesse a intenção de "fazer negócios", ou seja, revender o
triplex.
Tudo isso consta na segunda
parte do depoimento de Lula, publicado pelo próprio Estadão.
Em um segundo texto, a
jornalista Eliane Cantanhêde escreveu: "Lula jogou o apartamento no colo
da mulher dele, que já morreu e agora está no centro da Lava Jato. Marisa
Letícia é quem estava interessada no triplex (para investimento?) e Lula só
soube depois que ela tinha ido lá com o filho, mesmo depois da desistência da
compra. Essas mulheres..."
Cantanhêde precisaria ser
apresentada ao vídeo abaixo. Nele, a partir dos 10 minutos, vê-se a insistência
de Moro em interrogar
Lula sobre inúmeros documentos e datas de decisões tomadas
por Marisa. Incomodado com a enxurrada de questões que não tinha como esclarecer
sozinho, Lula fez um apelo ao juiz:
O FEMINISMO DE OCASIÃO
Também do Estadão, a
jornalista Vera Magalhães publicou sua opinião sobre a faceta machista do
depoimento de Lula, no Facebook, na mesma noite em que os vídeos foram
disponibilizados pela Vara Federal de Moro à imprensa.
Em "Mulher emerge como
investidora", ela sustentou que Lula "recorreu à dona Marisa para
deixar sob sua responsabilidade toda a transação do imóvel. As inconsistências
da defesa e o truque de terceirizar para alguém que morreu e, assim, não é mais
parte do processo não parecem ser um caminho jurídico seguro para alguém que
tem um séquito de advogados à disposição e armou um circo político para posar
de vítima de perseguição."
No comentário que fez à rádio
Joven Pan, Vera foi além em sua tese sobre dona Marisa não poder ter comprado o
triplex sozinha. E, para isso, deixou a veia feminista em casa:
"Essa coisa da Marisa
investidora, não para de pé. Eu cobri durante 10 anos política em Brasilia. Repórter ,
circulando pelo Palácio do Planalto, trabalhando pela Folha de S. Paulo e pela
revista Primeira Leitura. Não foram as vezes que procurei pessoas como André
Singer ou Franklin Martins, que eram secretários de imprensa na época, e pedi
entrevistas ou ter contato com dona Marisa e fazer um perfil. Qual era a
resposta sempre qualquer jornalista que cobriu o poder pode atestar? A dona
Marisa não fala, dona marisa é reclusa, ela gosta de cuidar dos netos, ela
gosta de cozinhar, ela gosta de cuidar do jardim. É disso que ela gosta."
E continuou:
"Naquele próprio comício
que Lula fez no velório da mulher, impróprio, ele também descreveu uma mulher
que começou a trabalhar como empregada doméstica, que ficava em casa, que dizia
pode ir cuidar da política cuidar do brasil, que eu cuido aqui da retarguada.
nunca foi pintada como alguém que tinha respsabilidade pelos investimentos da
familia. Esse personagem é totalmente novo, criada sem que possa sem se
defender, dizer que aquilo é verdade ou não. Do ponto de vista de um marido, um
homem, é pusilânime. Do ponto de vista da defesa, é um absurdo jurídico."
Confrontada por uma usuária
do Twitter, "militante petista", sobre a visão errada sobre Lula e
Marisa, Vera respondeu que, "por sororidade", não iria chamar a
leitora de "retardada".
Sororidade.
Onde estava a sororidade das jornalistas
e dos jornalistas da grande mídia quando Marisa faleceu em decorrência de todo
esse processo político, jurídico e midiático que a Lava Jato criou? Não só não
houve apoio como o assunto pareceu proibido.
A mídia hegemônica, aliás, se
apressou em dizer que era bom Lula não ousar usar politicamente a morte da
esposa, nem associar o fato à Lava Jato. Quase fizeram um manual de como ele
deveria se comportar no velório.
O feminismo (de ocasião) se
recolheu, ainda, quando delatores passaram a dizer que Marisa pediu reforma em
sítio, mas era segredo. Pediu reforma em triplex, mas era segredo. Pediu
terreno para Instituto Lula, mas era segredo. Ninguém presenciou a renião, só o
delator e Marisa.
Tudo isso há poucos dias.
Dona Marisa já não estava aqui para se defender.
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