"Algoz do PT no
escândalo do mensalão, o ex-deputado federal Roberto Jefferson diz que operação
Lava-Jato tem que tomar cuidado para não transformar ex-presidente em
vítima."
Depois de uma temporada preso
e uma luta feroz contra um câncer no pâncreas, o ex-deputado federal Roberto
Jefferson (PTB) prepara o retorno à cena política. Decidiu disputar uma vaga na
Câmara dos Deputados no ano que vem - resta saber se pelo Rio de Janeiro, seu
estado de origem, ou São Paulo. Condenado por corrupção no mensalão, ele aguarda
apenas a decisão da sua filha, a deputada Cristiane Brasil, que estuda se
candidatar ao Palácio Guanabara. Aos 63 anos, Jefferson recebeu VEJA para uma
conversa em seu escritório no Rio: opinou sobre a operação Lava-Jato, desafiou
Lula a ser candidato em 2018 e admitiu que o bloco do Centrão usou métodos
ilegais para derrubar o PT do poder.
Depois de cumprir pena por
corrupção e lavagem de dinheiro, o senhor anunciou que pretende voltar a se
candidatar em 2018. Por que? Estou dentro da faixa etária que não deve se
aposentar segundo a reforma da previdência. Falando sério, acho cedo para me
recolher em casa, tenho muito a dar ainda. Minha carreira foi abruptamente
interrompida no passado. Já tive a sentença do Joaquim Barbosa no processo do
mensalão. Agora quero saber a avaliação do povo. Esta sim, soberana, muito
acima da dele.
Acha que Lula também tentará
voltar a disputar eleições? Torço para que tente de novo o Planalto. Esta sim
será a grande sentença moral que ele irá receber: a derrota nas urnas. Vai
valer muito mais do que um mandado de prisão expedido pelo Moro. Contra uma
decisão judicial, Lula poderá sempre dizer que é vítima. A cara de pau para
inventar discursos é imensa. Já ouvi recentemente que o Moro estava trabalhando
para a CIA e que a Dona Marisa foi assassinada.
Não considera que ele pode
ser preso antes da campanha? No fundo, é o que ele quer. Lula deseja ser preso
para poder ter o discurso de que foi perseguido pela caneta togada do Moro. Ao
contrário de 2005, no auge do mensalão, desta vez acho certa a tese do FHC. É
importante deixá-lo sangrar até a eleição. Se Lula for preso, vai ter romaria
com bandeira de foice e martelo todo dia na porta da penitenciária em Curitiba.
Na época do mensalão, o
senhor dizia que Lula era inocente... É verdade. Na CPI, falei: “Sai daí Zé,
antes que faça culpado um homem inocente”. Hoje é diferente, são muitas as
evidências: apartamento no Guarujá, sítio em Atibaia e o enriquecimento dos
filhos. Mesmo assim, o Moro precisa ser inteligente e não prendê-lo. Lula
precisa ouvir um basta da sociedade.
O que o senhor vai dizer para
o eleitor quando for cobrado pelo envolvimento no mensalão? Vou perguntar se as
pessoas acharam justa a sentença. Também quero saber se consideram que tive
alguma importância na transformação que está ocorrendo no país. Fiz uma luta
solitária no momento mais forte do PT no poder.
Então considerou injusta a
sua condenação pedida pelo ex-ministro Joaquim Barbosa no processo do mensalão?
Sim, ele exagerou. Uma coisa é o delito eleitoral, que eu sabia que tinha
cometido. Outra é a corrupção. Encarei com serenidade aquela conduta
histriônica do Joaquim Barbosa. Ele jogou para a plateia, só não esperava que
anos depois apareceria o Sérgio Moro. Sem televisão ao vivo, um juiz de vara de
primeira instância se tornou muito maior do que ele. Fico satisfeito de ver que
o Joaquim Barbosa não passou para a história como o maior magistrado do país.
Essa tese de separar caixa
dois e corrupção não é uma conversa conveniente para políticos apavorados com a
delação da Odebrecht que vem por aí? Acho que tem que haver a separação do joio
do trigo. Uma coisa é quem recebeu dinheiro por corrupção para facilitar
negócio para empreiteira. Outra, o financiamento eleitoral. Não se pode chamar
caixa dois de corrupção.
Mas essa não é uma linha
muito tênue? Não. Caixa dois houve no Brasil o tempo todo, as empresas não
participavam de campanha de outra forma. Elas sempre queriam dar 10% por dentro
e 90%, por fora. Ninguém queria ficar exposto e aparecer em prestações de
contas bancando um candidato que depois poderia perder a eleição.
Foi este o seu caso? Sim.
Recebi 4 milhões de reais em caixa dois na eleição de 2004 em um grande acordo
com o PT. Tudo entregue na sede do PTB pelo Marcos Valério em malas de dinheiro.
Comprometi-me a não lançar candidato no Rio de Janeiro e São Paulo. Agora isso
virar corrupção ativa?
E não é? Não. Corrupção é
quando existe algum ato do executivo envolvido. Quando um agente público faz ou
deixa de fazer algo na administração que lesa a sociedade. Eu não tinha como
saber naquela época de onde o dinheiro vinha.
O eleitor está do seu lado
nesta tese? Claro. Do taxista à caixa do supermercado, todos me cumprimentam
hoje em dia. Recentemente, fui almoçar com a minha mulher em um restaurante em
Copacabana e fui aplaudido de pé. Muitos dizem: “Obrigado por derrubar o José
Dirceu, senão teríamos virado uma Venezuela”.
Até onde vai a operação
Lava-Jato? Para o bem dela, acho que está na hora de parar de inventar. É hora
de fechar o pacote, senão vira uma guerra napoleônica. Chega de aceitar novas
delações. O país tem que andar para frente.
“É hora da Lava-Jato parar de
inventar. Senão vira uma guerra napoleônica”
Qual a diferença entre a
Lava-Jato e o mensalão? O mensalão era mais genérico e não tinha provas tão
densas. Contas no exterior foram rastreadas com valores monstruosos. Ajudou
também o fato de um monte de madame usar cartão de crédito para comprar roupa
de grife.
A Lava-Jato desvendou um
esquema de recursos montado por PT e PMDB. Não é contraditório você e seu
partido baterem apenas nos petistas? Não. O governo Temer não está envolvido na
Lava-Jato. Por enquanto só há fumaça contra os integrantes do governo, mas não
há fogo.
Temer não está tentando
proteger seu governo com a indicação de Alexandre de Moraes para o Supremo? Não
há blindagem neste tipo de escolha. Por exemplo: quando o Lula nomeou o Joaquim
Barbosa naquela cota para negros que ele criou no Supremo, jamais se imaginou
que ele condenaria petistas. Os ministros Luiz Fux e Dias Toffoli também agiram
com independência mesmo depois de indicados pelo PT. Tenho certeza que Alexandre
de Moraes seguirá pelo mesmo caminho. Ele é um profissional extremamente
qualificado. Não tentará agradecer a indicação dando canetadas contra
evidências em processos.
O seu partido, o PTB,
participa do Centrão desde os tempos de Eduardo Cunha. Vocês continuarão no
grupo? Não, chegou a hora de passar uma borracha nisso. Aquilo foi um grupo
montado para derrubar a Dilma Rousseff usando os métodos de guerrilha das
FARCs: vendendo entorpecente, sequestrando e extorquindo. O mesmo jogo que o PT
sempre praticou.
E por que a maioria do
sistema político se aliou a estas FARCs durante o impeachment? Porque eles eram
um mal menor ao país. O mal maior era o PT continuar no comando do Palácio do
Planalto. Usaram instrumentos legais e ilegais? Sim, usaram. Mas chegou a hora
de celebrar a paz como na Colômbia. Tem que desarmar todo mundo.
Qual o candidato favorito a
vencer a eleição presidencial de 2018? Geraldo Alckmin. Faz um governo muito
sério em São Paulo e emplacou o João Dória no primeiro turno.
Mas como fica o Aécio, atual
presidente do PSDB? Este é um grande amigo. No período em que estive preso,
sempre me enviou uma palavra de solidariedade através da minha filha. O
problema é que ele perdeu as duas últimas eleições em Minas Gerais.
E o Serra, que agora deixou o
governo? É um grande pensador, mas se afastou da gestão diária de um orçamento.
O grande executivo tucano é o Geraldo.
Marina Silva tem chance em
2018? Não acho. O partido da Marina é um puxadinho do PT. Ela faz aquela pose
de Madre Teresa de Calcutá, mas foi ministra desse governo petista que não teve
ética alguma. Também não ficou sabendo de nada?
“O Centrão atuou como as
FARcs para derrubar a Dilma Rousseff. Extorquindo, sequestrando, o mesmo jogo
que o PT sempre praticou”
E a febre Bolsonaro? Este
terá um grande desempenho. Pode chegar a mais de 20% dos votos. Sozinho e em um
partido nanico, está fazendo um marketing impressionante na internet. É uma
espécie de Trump brasileiro, representando a antítese da nova ordem mundial
globalizante. Vai dar trabalho.
No Twitter, o senhor tem se
caracterizado por algumas posições semelhantes as do Bolsonaro. Depois de um
período aliado ao PT, é neste espectro político que o senhor se sente mais à
vontade? Nunca fui de esquerda. Perdi por 32 a 1 na executiva nacional do PTB a
votação que tratava desta aliança. Estava claro que não dava para misturar água
com azeite. Foi um grave equívoco apoiar o governo Lula em 2003. O PT fez um
projeto de poder populista. Queriam se perpetuar no poder de qualquer jeito.
O PT acabou? De jeito nenhum
e nem desejo isso. O PT tem um papel importante. São melhores na oposição do
que governando.
O que dizer sobre a
descoberta de que Sérgio Cabral mantinha contas no exterior com saldo de 100
milhões de dólares? Nunca imaginei um esquema tão grande. Sinto muito pelo pai
e pelos filhos dele. O que pesou para Cabral foi a sua falta de liturgia no
exercício de um cargo público. Expôs-se demais em festas. Colocou guardanapo na
cabeça para dançar em restaurantes. Isso demoliu o patrimônio moral dele.
Depois do seu período no
cárcere, que tipo de conselho o senhor daria para o presidiário Cabral? Ele tem
que se reaproximar de Deus. É importante se reconciliar com valores religiosos
e morais para que possa pacificar o seu coração. Cabral precisa admitir seus
erros e pedir perdão para Deus e toda a sociedade. E vai ter que se preparar
psicologicamente: pelo caminho que as coisas vão, a sentença judicial será
muito dura contra ele.
O que mais chamou a sua
atenção na cadeia? Vi muitas coisas lá dentro. Eu que sou católico, aprendi a
respeitar o trabalho feito pela igreja Universal. Também vi o PSOL trabalhando
a favor de marginais sempre com o discurso safado de que a culpa de existir um
estuprador ou homicida é da sociedade.
O que o senhor fazia para passar
o tempo? Lia livros e assistia TV. Vi o Brasil perder de 7 a 1 para a Alemanha
na cela. Certa vez, acharam que eu ia me matar com extensores, mas estava
apenas me preparando para malhar. O banho frio, o boi (buraco no chão que serve
como vaso), nada disso me afetou. O mais difícil mesmo foi ficar isolado do
mundo e longe da família por longos 14 meses./ VEJA
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